As chuvas expressivas que elevaram as águas dos rios Taquari e Forqueta e os arroios Grande e do Meio, causaram muitos estragos na área urbana e rural. Além de alagar moradias, interromperam o trânsito em vários trechos. A estrada geral de Forqueta Baixa ficou interditada em diversos pontos. A VRS-811 nas imediações da família Stork, em Forqueta, em Cairu, Travesseiro, além de trechos da estrada de Picada Vinagre, de Três Saltos Baixo, Linha São João e Barra do Fão. A imensidão do manancial lembrou muito a enxurrada de 2010 e trouxe transtornos na logística de empresas de transportes, atrapalhando ainda centenas de trabalhadores.
PERDA TOTAL E SEM PERSPECTIVAS – Aloísio Turatti, 39 anos, natural de Encantado, mudou-se com a esposa e dois filhos para a rua Waldemar Moesch, no Centro, em fevereiro. “A enchente veio muito rápido. A prefeitura não tinha caminhões para todo mundo. Na minha rua, apenas duas famílias não puderam ser ajudadas, infelizmente a minha era uma delas. Perdemos praticamente tudo. Coisas que levam uma vida inteira para serem conquistadas. Apenas conseguimos salvar os documentos”, revela.
Aloísio é motorista profissional, mas está com dificuldades de encontrar serviço fixo. Sua esposa era empregada doméstica em Lajeado, mas acabou sendo dispensada em decorrência da pandemia da covid-19. Ambos já estão cadastrados no Cras, mas dependerão de renda fixa para se reerguer. No momento, foram acolhidos por um familiar que também mora no Centro.
A PRIMEIRA ENCHENTE DE UMA VIDA – A família de Elizete Ferreira, 48 anos, que reside na rua Tiradentes há seis anos, enfrentou a primeira enchente da vida. Anteriormente residiam no Centro, num imóvel que também foi atingido pela cheia, mas conseguiram se organizar para não serem afetados. Nesta oportunidade, imaginavam que não chegaria próximo ao imóvel. Por volta das 5h de quarta-feira, perceberam que a água atingiu a casa do cachorro, foi quando pediram ajuda da prefeitura, para retirar os principais eletrodomésticos e eletroeletrônicos. Alguns móveis não puderam ser retirados. A família precisou ser acolhida no Ginásio Municipal do loteamento Glória. “A enchente atingiu muitas moradias que jamais imaginávamos que pudesse atingir. Estamos preocupados com as outras famílias. Por sorte temos trabalho e renda para nos reerguer.”
PRIMEIRO A COVID, DEPOIS A ENCHENTE – A moradora do bairro São José, Maristela Alencar, 36 anos, mora no bairro São José desde 2017. Como estava ajudando seu marido, que se trata da covid-19, não conseguiu se organizar para salvar eletrodomésticos e móveis a tempo. “O previsto eram 24 metros e calculávamos que só chegaria na frente da casa. O rio acabou subindo muito rápido. Não conseguimos salvar praticamente nada. O pior é que meu marido é autônomo e está sem serviço e eu acabei sendo dispensada na virada do mês”.
SEM ENERGIA – A interrupção no fornecimento de energia elétrica, afetou a área central de Arroio do Meio, desde às 15h de quarta-feira, dia 8. Grande parte do Centro e bairro Navegantes, ainda estavam sem luz até o fechamento desta edição. Além de danos na rede, alguns transformadores ficaram submersos e estragaram. Não havia perspectiva para o reestabelecimento de energia, que depende de protocolos que privilegiam a segurança da população e operários da companhia. Algumas instituições como o Hospital São José e a prefeitura, locaram geradores para continuar operando. A alternativa também foi adotada por empresas.
Também houve queda parcial no fornecimento em outros bairros durante a noite de quarta-feira e a madrugada de quinta-feira.
CORRENTEZAS DESCONHECIDAS – Os proprietários da Maderon haviam se preparado para uma cheia do porte de 2001, mas se depararam com algo jamais vivenciado desde que estão estabelecidos no bairro Bela Vista, há 40 anos. “Destruiu tudo, a cerca, o calçamento, o muro, levou madeiras para tudo que é lado. Parecia um cenário de guerra. A água entrou dentro do prédio na altura 1,3 m. Atingiu todas as máquinas e equipamentos. Ainda não tivemos tempo para avaliar o prejuízo”, informou Nara Kalsing.
“Nesta hora não se sente frio”
O bombeiro Guilherme Schuck, 36 anos, morador de Arroio do Meio, revela que uma força tarefa do Corpo de Bombeiros de Santa Cruz do Sul, ajudou no resgate de famílias no município e região. As linhas do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil estavam congestionadas. Muitas famílias só conseguiram dizer que estavam em apuros por meio das redes sociais, após interlocução com parentes e conhecidos de outras regiões.
Segundo Schuck, moradores do bairro Navegantes estavam ilhados. A área só era acessível com botes e barcos. Diversos soldados e voluntários participaram do resgate. Entre as pessoas socorridas estavam idosos, portadores de necessidades especiais e crianças. O trecho mais curto e com menos correnteza para fazer a travessia foi o nas imediações da Brigada Militar.
A cheia atingiu casas onde jamais havia chegado água. Na extensão da rua Campos Sales e na Maurício Cardoso, da ponte nas imediações da Minuano, até a Serralheria Majolo, apenas duas casas não foram atingidas. Um dos imóveis era a casa da mãe de Schuck, onde quatro famílias pediram abrigo e a outra era do agente penitenciário aposentado, Ricardo Korb.
A água, inclusive, invadiu o quartel da Brigada Militar, numa altura de 15 cm. “Foi muito maior que 2001. A elevação foi muito acima do que a projetada pelas elevações em Estrela. A correnteza arrancou muros, cercas e levou parte de casas. O quartel da BM só podia ser acessado por quem se segurava nas grades. Muita gente ajudou. A água subiu muito rápido, em questão de minutos. Era visível. Só não foi pior porque tinha luz até as 22h. Mas depois disso, o desespero tomou conta das pessoas. Nesta hora não se sente frio. A comunidade precisa ser solidária. Muita gente nem conseguiu levar consigo as roupas”.