Na próxima terça-feira, 706 crianças de zero a três anos voltam ou iniciam suas rotinas fora de casa. Na data, todas as Escolas Comunitárias de Educação Infantil (Eceis) de Arroio do Meio, mais a extensão de Forqueta, terão retornado às atividades, depois do período de férias. As escolas infantis, especialmente a etapa creche, têm sido um importante suporte para as famílias do município, ao longo das últimas quatro décadas. Muitas mães só estão trabalhando porque têm um local adequado para deixarem seus filhos. Foi justamente o mercado de trabalho que fez a creche se tornar realidade, não só em Arroio do Meio, mas em boa parte dos municípios.
Ao longo dos anos, as escolas infantis passaram por mudanças consideráveis, seja na estrutura física, com ampliações e construção de novas unidades, ou na questão pedagógica. O atendimento é feito por profissionais capacitados e a etapa creche é considerada um período especial no desenvolvimento das crianças e segue uma série de determinações previstas em lei.
Hoje são oito Eceis, mais uma extensão em Forqueta. Para 2020 estão inscritas 706 crianças de zero a três anos na etapa creche. Nas Eceis Professora Rita e Criança Esperança, ambas em Bela Vista, também são ofertadas 60 vagas de contraturno dos níveis A e B, para crianças de quatro a cinco anos, que obrigatoriamente frequentam a pré-escola.
A organização e gerenciamento das Eceis é feita pela direção, em parceria com os pais. Cada escola tem sua associação de pais e a coletividade é chamada anualmente para assembleias, reuniões de planejamento e participação em atividades. A contratação de profissionais é feita pelas Associações de Pais de acordo com a demanda, enquanto que a diretora é contratada pelo município. Orientações e normas de funcionamento que são estabelecidas pelo Conselho Municipal da Educação, devem ser seguidas por todas as unidades.
O município oferece o apoio pedagógico e nutricional por meio dos profissionais da Secretaria de Educação, capacitações, toda a merenda básica e ainda faz um repasse financeiro, a chamada bolsa-aluno. É como se o município comprasse uma vaga na escola comunitária. Neste ano, para cada aluno da etapa creche o município vai repassar uma bolsa de R$ 581 mensais. Este valor é gerido pelas escolas e utilizado para o pagamento dos profissionais, água, luz e para a compra de materiais, incluindo o de higiene e limpeza, pedagógico e brinquedos, e manutenções ou investimentos de pequeno e médio porte. No total são 146 educadores e 24 profissionais de apoio, responsáveis pela merenda e limpeza. Para 2020 o investimento do município nesta etapa da educação infantil, só no repasses de bolsa-aluno, deve superar os R$ 5 milhões.
A contribuição espontânea
A participação financeira dos pais é uma prática antiga e visa complementar os recursos para qualificar o atendimento. Cada Associação de Pais aplica o valor de acordo com sua necessidade e presta contas nas assembleias para os pais e também através de documentos para o município.
A forma de pagamento foi contestada por alguns pais no ano passado, originando uma denúncia ao Ministério Público. Até então algumas associações de pais emitiam boletos com o valor das contribuições, na faixa de R$ 200 por criança. Em novembro, a Promotoria de Justiça Regional da Educação de Santa Cruz do Sul orientou o município e as diretoras a suspenderem a cobrança via boleto, no entendimento de que o documento condicionava o pagamento de um valor para uma contribuição que deve ser espontânea. “Não é uma ação, o município não foi penalizado. Foi apenas uma orientação do Ministério Público e que foi repassada para as diretoras e acatada por todas as Associações de Pais”, explica a secretária de Educação, Mara Betina Forneck.
A equipe da secretaria de Educação ainda não tem um levantamento completo de como a medida repercutiu nas escolas. Mas, tanto Mara como a coordenadora da Educação Infantil, Denise Neumann, ressaltam que as associações de pais se mobilizaram para que a mudança não comprometa a qualidade do atendimento. Elas também reforçam que, inclusive antes da orientação da promotoria, as famílias com dificuldades de contribuir são orientadas a procurar a escola e que estas situações são analisadas e acolhidas da melhor forma, sendo que nenhuma criança é impedida de frequentar a escola por causa disso.
As atividades das Eceis neste ano continuam igual ao ano passado. Mara e Denise acreditam que a maioria dos pais entende a importância de contribuir com a educação dos filhos e vai continuar participando financeiramente. “A contribuição qualifica a estrutura na qual as crianças estão sendo atendidas. E este recurso que vem dos pais faz a diferença dentro das escolas. O que o município repassa dá conta do básico, mas as escolas têm necessidades que vão além. Graças a esta parceria do poder público com os pais podemos nos orgulhar da qualidade das nossas Eceis que têm o acesso livre para todas as pessoas que moram no município”, afirma Mara, apontando que o orçamento municipal tem limitações e a educação recebe mais de R$27 milhões, que representa 34% da receita.
Legislação
Pelo Plano Nacional de Educação, até 2024, todos os municípios devem atender na educação infantil pelo menos 50% das crianças de zero a três anos. O Plano Municipal de Educação de Arroio do Meio estipula que este percentual seja maior, de 70%. Hoje, o município estima que 78% das crianças nesta faixa etária, já sejam atendidas nas Eceis, mesmo que nesta faixa etária a matrícula não seja obrigatória.
O Plano Nacional também estipula que o atendimento na etapa creche seja de, pelo menos, em turno parcial de quatro horas, no mínimo e em turno integral de 7 horas. Seria um terço do que hoje as Eceis oferecem. “A demanda da nossa comunidade é outra e nos organizamos para atendê-la”, pontua a secretária.
Na etapa pré-escola, que inclui crianças de quatro e cinco anos, a matrícula é obrigatória. Neste ano serão 441 vagas em turno parcial e ainda 240 vagas de turno integral para alunos nesta faixa etária, mais os 60 que vão frequentar as Eceis do bairro Bela Vista.
Divergências
Quando o assunto é a contribuição financeira para com as Eceis, a divergência dos pais e da comunidade é grande. Há quem entenda que R$ 200 seja um valor quase irrisório pelo serviço oferecido, considerando a estrutura, o atendimento por profissionais capacitados, a alimentação balanceada e a responsabilidade com as crianças 12 horas por dia. Por outro lado, há quem considere o valor alto, especialmente para as famílias de poder aquisitivo menor e/ou com mais filhos, e defenda um sistema de contribuição proporcional à renda familiar.
Também tem pessoas que defendem que o município deveria bancar o custo em 100%, enquanto outras, acham a medida descabida, entendem que a criação dos filhos é responsabilidade dos pais e o custeio total limitaria investimentos em outras áreas, como saúde e obras.
Quanto ao sistema de cobrança, há quem considere um avanço o fim da emissão de boletos. Alegam que os documentos impunham uma espécie de “obrigação moral” no pagamento do valor, já que havia a possibilidade de ir para órgãos de proteção ao crédito em caso de atraso superior a três meses.
A etapa creche em números
• Oito Escolas Comunitárias de Educação Infantil – nos bairros Navegantes, Aimoré, Novo Horizonte, Bela Vista (2), São José, São Caetano e Rui Barbosa. Também há uma extensão da Ecei Pimpolho de Rui Barbosa em Forqueta;
– Neste ano são 766 crianças matriculadas – 706 de zero a três anos e 60 com idade entre quatro e cinco anos;
• Repasse municipal direto de R$ 581,00 por criança, o que deve ultrapassar os R$ 5 milhões em 2020. O município também disponibiliza a estrutura física, a merenda, a contratação das diretoras e a assistência pedagógica e nutricional;
Creche Atalaia Infantil, o início de tudo
Na década de 1980, quando a industrialização teve grande expansão na Pérola do Vale, havia demanda por mão de obra e as mulheres queriam e precisavam trabalhar. Assim como a Administração Municipal da época, que tinha como prefeito João Gasparotto, atraiu indústrias, foi em busca de recursos para a construção da primeira creche, a Atalaia Infantil. A construção foi viabilizada mediante convênio com o Estado, por meio do Programa Pró-Creche, no qual o município foi o responsável pela execução da obra.
A Creche Atalaia Infantil foi inaugurada em 21 de julho de 1981, num grande evento que contou com a presença da então primeira-dama do Estado, Miriam Gonçalves de Souza, incentivadora e idealizadora do Programa Pró-Creche. Foi um marco para Arroio do Meio. O prédio ficava no terreno que hoje é utilizado como estacionamento, na entrada da Área de Lazer Pérola do Vale e iniciou atendendo a 63 crianças.
Com o desenvolvimento econômico e social, a população foi crescendo, os bairros se expandindo, e o número de creches foi ampliado. Até o fim da década de 1990 eram seis. No entanto, o sistema de funcionamento era muito diferente se comparado aos dias atuais. Esta etapa do desenvolvimento infantil não estava ligada à pasta da Educação, mas sim, à Assistência Social. Havia preocupação com o desenvolvimento pedagógico, mas o foco principal era dispor de um espaço no qual as crianças pudessem permanecer, enquanto as mães trabalhavam. Eram atendidas crianças até os sete anos e o atendimento não era feito, obrigatoriamente, por profissionais com formação pedagógica.
Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), estabeleceu uma nova forma de tratamento para a educação infantil. A partir de então as creches foram vinculadas à secretaria de Educação e transformadas em Escolas Comunitárias de Educação Infantil, administradas pelas associações de pais. Desde o início o sistema foi comunitário, com a contribuição financeira dos pais para a manutenção do serviço, modelo que continua em vigência. A organização pedagógica vem sendo aprimorada, seja por demanda municipal, ou atendendo à legislação que estabelece os parâmetros para a educação infantil etapa creche.