Foi aprovado recentemente, por 18 votos a favor e nove contrários, pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, o parecer do relator deputado Luiz Nishimori (PR-PR), que flexibiliza o uso de agrotóxicos em todo o território nacional. Agora o projeto de lei que trata do registro, fiscalização e controle dos agrotóxicos em todo o país, segue para apreciação do plenário da Câmara. Parlamentares, ambientalistas e ruralistas divergiram na apreciação da proposta.
Chamado de PL do Agrotóxico por deputados da oposição e ativistas, o projeto prevê, por exemplo, a alteração do nome “agrotóxicos” para “pesticidas”, o que deve facilitar o registro de produtos cujas fórmulas, em alguns casos, são compostas por substâncias consideradas cancerígenas pelos órgãos reguladores. Antes, a proposta era alterar a nomenclatura para produto fitossanitário.
As definições sobre as competências do Ministério da Agricultura (Mapa), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) na análise dos produtos também foram alteradas pela proposta de Nishimori. A nova redação diz que os órgãos passam a analisar e, “quando couber”, homologar os pareceres técnicos apresentados nos pleitos de registro. Outro ponto polêmico se refere à criação da Taxa de Avaliação de Registro. A arrecadação, conforme o texto, será destinada ao Fundo Federal Agropecuário.
O PL tramita na Câmara desde 2002, quando o atual Ministro da Agricultura Blairo Maggi (PP), considerado um dos maiores produtores de soja do país, propôs que o registro dos agrotóxicos se desse pelo nome científico e não pelo nome comercial, o que para ele, facilitaria o registro dos pesticidas, uma vez que as empresas poderiam usar a autorização já concedida a produtos com o mesmo princípio ativo.
É preciso mobilizar-se
Contrário ao projeto de lei, o engenheiro agrônomo do Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia (Capa), Lauderson Holz, que defende a produção de alimentos livre de agrotóxicos, lembra que o projeto entrou na Câmara em 2002, e só agora, 16 anos depois, é pautado e aprovado pela comissão especial da Câmara dos Deputados. Ressalta que o avanço na produção de produtos orgânicos, livres de agrotóxicos, vem se destacando desde então, com a realização de pesquisas e estudos voltados à atividade. Nesse período a Europa baniu vários princípios ativos de agrotóxicos.
Justifica a contrariedade dizendo que a mudança do nome de agrotóxicos para fitossanitário ou pesticida não condiz com a realidade, uma vez que ao contrário dos fitossanitários, agrotóxicos fazem mal à saúde, e vai mais longe dizendo que os agrotóxicos matam. Cita que atualmente os processos de avaliação de riscos de princípios ativos dos agrotóxicos envolvem o Ministério da Agricultura, Ministério do Meio Ambiente e Anvisa. A nova proposta retira o Ministério do Meio Ambiente e a Anvisa das avaliações de riscos dos princípios ativos dos agrotóxicos ao meio ambiente e a saúde pública, dando exclusividade ao Ministério da Agricultura (Mapa). “Qual a preocupação do Mapa com o ambiente e a saúde das pessoas?”, questiona.
Por outro lado, Lauderson acredita que o projeto vá a plenário para votação somente depois das eleições de outubro, uma vez que tem grande rejeição popular. Só depois disso deve ser votado e aprovado, caso não haja pressão forte da população. Revela ainda que no Congresso Nacional, 1/3 dos deputados se identificam com a bancada ruralista e do agronegócio o que é um indicativo de aprovação. Outros grupos possuem interesse no assunto e inclinam-se a votarem a favor.
“Além do movimento agroecológico, da Anvisa, Ministério Público, pesquisadores e outras entidades representativas da sociedade tem se mostrado contrárias ao projeto”, e complementa, “a população não quer mais agrotóxicos na comida. Queremos alimentos de boa qualidade em nossas mesas. Saudável, nutritiva, que respeite e preserve o ambiente e que promova a vida”, desabafa.
Conclui revelando que a comissão que aprovou o projeto é composta por quatro deputados gaúchos. Três deles votaram a favor do PL 6299 de 2002. “Logo esses deputados estarão em nossa região pedindo votos. Precisamos estar de olhos bem abertos.”
Viabilizar a produção
Sem a utilização de agrotóxicos, em suas lavouras de soja, Maciel Schmitz, de Passo do Corvo, não teria a rentabilidade de em média 60 sacas por hectare, a qual considera boa. São pelo menos cinco aplicações entre fungicidas, pesticidas, inseticidas e acaricidas, desde a preparação do solo até a colheita do grão. Diz que a não aplicação dos produtos inviabilizaria a atividade do ponto de vista econômico e produtivo.
Lembra que a primeira aplicação inicia antes mesmo do plantio com a aplicação do herbicida para dessecação da lavoura. Esse herbicida é aplicado com o objetivo de deixar a lavoura limpa para o plantio eliminando plantas indesejáveis. A semente posta na terra também é tratada para que roedores e insetos não a danifiquem. Após o nascimento da planta é aplicada o fungicida destinado ao controle de fungos e pragas, como o percevejo e a lagarta. Entre a floração e finalização do grão, são ministradas entre duas e três aplicações de fungicida, este para controlar a Ferrugem Asiática registrada em grande parte das lavouras da região. “Temos consciência que o agrotóxico faz mal à saúde, mas sem ele, como iríamos produzir? A produção ficaria inviabilizada em razão da baixa produtividade de algumas atividades, a exemplo da soja”, aponta.
Inca
O Instituto Nacional do Câncer, órgão do Ministério da Saúde, divulgou nota defendendo que o Marco Legal do Agrotóxico não seja flexibilizado, o que representa um retrocesso em razão do risco que representa. “O Inca defende que o Marco Legal dos Agrotóxicos (Lei 7.802/1989) não seja alterado e flexibilizado pelo Projeto de Lei nº 6.299/2002. Para o Instituto, tal modificação colocará em risco trabalhadores da agricultura, residentes em áreas rurais ou consumidores de água ou alimentos contaminados, pois levará à possível liberação de agrotóxicos responsáveis por causar doenças crônicas extremamente graves e que revelem características mutagênicas e carcinogênicas.”
Anvisa
Agência manifestou-se contrariamente ao Projeto de Lei aprovado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados e que propõe que tais produtos não passem por avaliação sobre os riscos à saúde. Para a Anvisa, o PL não contribui com a melhoria, disponibilidade de alimentos mais seguros ou novas tecnologias para o agricultor e nem mesmo com o fortalecimento do sistema regulatório de agrotóxicos, não atendendo, dessa forma, a quem deveria ser o foco da legislação: a população brasileira.
O texto cita ainda, “A Anvisa vai continuar mantendo sua posição de mostrar os prejuízos e riscos que esse PL, caso aprovado, trará para a saúde da população, até a última instância possível”.