Depois de vários anos atuando fora do país e em São Paulo, Claiton Fernandez retorna ao Vale do Taquari, com uma vasta experiência profissional e acadêmica. Atuando como consultor empresarial, Fernandez afirma que o país está em transição, com mudanças estruturais e de valores, que farão nascer um novo país. Apesar do momento delicado, acredita que é tempo ideal para as empresas reverem suas posturas, seja interna ou externamente e fazerem a mudança do EGO (força do indivíduo) para o ECO (força do coletivo). Saiba mais na entrevista que segue:
AT- Quem é Claiton Fernandez, qual a sua formação acadêmica, experiência profissional e campo de atuação?
Claiton Fernandez – Sou Claiton Fernandez, 56 anos, filho de Seno Fernandes (in memorian) e de Cladi Fernandes, natural de Picada Arroio do Meio/Arroio do Meio. Iniciei meus estudos na Escola Municipal Afonso Celso e, na sequência, fiz o Ensino Fundamental no Colégio São Miguel e no Seminário Sagrado Coração de Jesus, em Arroio do Meio. Concluí o Ensino Médio no Seminário São João Batista, em Santa Cruz do Sul. A carreira acadêmica iniciou na FISC – hoje UNISC – com a Faculdade de Ciências Contábeis. Após, fiz os cursos de pós-graduação de Administração de Recursos Humanos e de Gestão Empresarial, na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, e Business and Management for International Professionals (Negócios e Gestão para Profissionais Internacionais) na University of California, Irvine/Estados Unidos. O Mestrado Profissional em Administração fiz nas Universidades de Madero, Puebla/México, e na Metodista de Piracicaba, São Paulo. E o Doutorado em Administração, na Universidade de São Caetano do Sul/São Paulo.
A minha experiência profissional iniciou na cidade de Santa Cruz do Sul, após a passagem pelo Seminário. As maiores experiências foram junto ao Unibanco, Arcal S/A e Umbro, onde ocupei funções executivas. Na Prefeitura de Santa Cruz do Sul, durante três gestões distintas, ocupei os cargos de Contador Geral do município, Coordenador Tributário, Secretário Municipal da Fazenda e Secretário Municipal da Administração. Em nível nacional, mais precisamente em São Paulo, ocupei os cargos de Presidente de Conselho Administrativo, CEO e Diretor Executivo junto aos grupos econômicos Batistella, Brigatto e Furlan. Atuei também como consultor de negócios na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo e do Banco Bradesco. Sou membro do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa e professor de cursos de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas. Em nível internacional, fui estudante e professor nos Estados Unidos e no México. Há 5 anos atuo no projeto gestão esportiva da Federação Internacional de Futebol (FIFA). Em 2009, constituí minha própria empresa – FERNANDEZ Projetos & Consultoria – que, desde outubro/2015, está com sede na cidade de Lajeado/RS. O meu campo de atuação profissional está voltado para empresas, prefeituras e clubes esportivos. Principais serviços executados: projetos de expansão e de viabilidade de novos negócios; assessoria na intermediação de fusões, incorporações e negociações entre empresas e grupos econômicos; desenvolvimento de projetos culturais, artísticos, esportivos e da saúde (Lei Rouanet e outros) com captação de recursos financeiros; projetos de recuperação financeira; conselheiro independente em empresas de capital aberto ou fechado; gestão de empresa familiar; diagnóstico dos processos e do perfil profissional; planejamento estratégico; realização de treinamentos (cursos, palestras, workshops, seminários, congressos). Durante estes anos todos também tenho escrito livros e artigos, com publicação em periódicos nacionais e internacionais.
AT – O seu trabalho tem como um dos focos a gestão estratégica de empresas e formação de equipes. Nossas empresas estão preparadas para enfrentar o atual momento?
Claiton Fernandez – As empresas não estão preparadas para enfrentar crises, porque a grande maioria acredita que nunca terá uma crise que ameace o seu negócio. Envolvidas pelas rotinas diárias, esquecem que as crises são ameaças constantes aos seus valores. Discutem-se metas, resultados, planos de marketing, endomarketing, plano de expansão, mas não colocam a gestão de riscos ou a gestão de crises como pautas das reuniões do planejamento estratégico. É um erro básico de gestão.
AT – Hoje se fala que a crise econômica no Brasil é causada, em grande parte, pela crise política. Que avaliação o senhor faz do atual cenário político-econômico-social brasileiro? O senhor vê saídas a curto e médio prazo?
Claiton Fernandez – O cenário político é grave e os reflexos se estendem aos setores econômico-social. Vivemos uma crise moral e, sem uma crise de tamanhas proporções, dificilmente a sociedade brasileira se mobilizaria para mudar o país. Interesses egocêntricos ainda predominam quando o desafio é sistêmico. O país está em transição. As mudanças são estruturais e de valores. Nascerá um novo país. Estamos saindo da era tradicional (do EGO – força do indivíduo), com predomínio do poder, do controle, do monitoramento, cheia de desconfianças, da competitividade, do ganha-perde. Iniciou uma era nova (do ECO – força do coletivo) onde reside a conexão, a cooperação, o desenvolvimento da comunidade, um consumo consciente, o ganha-ganha. As mudanças serão lentas, necessitam da parcela de contribuição de todos nós brasileiros. Caminharemos em solo mais firme a partir de 2020. Mas o Brasil tem jeito, sim.
AT – O Vale do Taquari é uma região que tem sua base econômica focada na produção de alimentos e, por isso, não tem sentido tanto os reflexos da recessão econômica. Que postura a classe empresarial do Vale deve adotar, a fim de evitar que a crise se instale na região?
Claiton Fernandez – A crise econômica é em cadeia e em algum momento chegará mais forte ao Vale do Taquari. Alguns setores como de automóveis, de varejo e do imobiliário já foram atingidos. Mas o reflexo ainda não é com tanta intensidade do restante do Estado e país. Aliás, temos belos exemplos de empresas no Vale do Taquari que, em meio às dificuldades do atual cenário econômico, mantiveram seus projetos de investimentos: Girando Sol, Neugebauer, Dália, Fruki, Cooperativa Languiru. A postura para momentos como este atual é aproveitar para arrumar a casa, revisitar a missão, a visão e os valores, alinhar processos e investir em treinamentos, ajustar o modelo de negócios e o planejamento estratégico, fomentar o equilíbrio financeiro e a inteligência emocional, ter transparência com os stakeholders (funcionários, fornecedores, parceiros, clientes).
AT- Há quem diga que os momentos de crise são também momentos de oportunidades. Quais são os setores que têm melhores perspectivas neste momento?
Claiton Fernandez – Isso é uma grande verdade. Não é à toa que o ideograma chinês para crise e oportunidade é o mesmo. Em ano de crise, todo mundo quer gastar menos. Por isso, negócios que permitam economizar estão em alta. É preciso pensar, pesquisar, buscar soluções inovadoras, inteligentes e pontuais. Oportunidades de negócios com melhores perspectivas: a economia compartilhada (achar atividades onde possa fazer parcerias com pessoas desempregadas); negócios com potencial de exportação; novas soluções digitais móveis; revenda de carros usados e oficinas mecânicas; loja de bicicletas e de reparo/conserto de roupas e calçados; reformas de casas e apartamentos; alimentação.
AT – O senhor estudou e trabalhou com educação em outros países. Como avalia a qualidade do ensino no Brasil?
Claiton Fernandez – É baixa, distante do ideal. Não prepara para a cidadania e para o mercado de trabalho. Em sala de aula, ainda predomina o conservadorismo, falta valorizar inovações na didática e a aplicação de métodos mais modernos. Parece-me que nem sempre o aluno encontra o professor que deseja e nem o professor encontra o aluno que ele gostaria de ter, o que é um encontro repleto de dissabores e frustrações. Falta direcionamento, um plano de educação eficaz para o país, mudanças culturais e do sistema vigente. Em sala de aula, o professor precisa dar uma aula diferente, de aprendizado ativo, envolvendo os alunos, o que requer treinamento contínuo e muita habilidade interpessoal. As aulas tradicionais são expositivas e uma ótima estratégia para ensinar, mas não é a maneira ideal de aprender, porque o aluno não exercita sua capacidade de abstração. Ensina-se, por exemplo, pouco português e matemática, bases de sustentação e evolução da pessoa e do profissional. Existe uma lacuna enorme entre o conteúdo da sala de aula e as exigências do mercado de trabalho. O que a sala de aula não ensina e o mercado de trabalho exige: autoconhecimento, valores, preparo para a liderança, gestão de negócio próprio, capacidade de reflexão, adaptabilidade, flexibilidade, inovação, resiliência, assertividade, aprendizado contínuo, inteligência emocional, boa comunicação, automotivação, proatividade, educação financeira.
AT – Seu trabalho também inclui uma das paixões nacionais, o futebol. Como o negócio futebol interfere nas organizações futebolísticas e, até mesmo, dentro de campo?
Claiton Fernandez – Sou um apaixonado por esportes e o futebol é o preferido. Atuei como jogador por vários times amadores do Vale do Taquari. Sou um estudioso do modelo de negócios do futebol. Fiz alguns projetos de modernização para clubes e federações de futebol profissional, em nível nacional. Conheço bem as estruturas do Grêmio, Internacional, Flamengo e São Paulo e, em nível internacional, o Barcelona, Chelsea e Milan. Mantenho contatos até hoje com clubes e jogadores brasileiros e do exterior. O projeto de gestão esportiva com a FIFA me proporciona isso. O futebol é um grande negócio e, como tal, tem provocado diversas transformações no ambiente das organizações futebolísticas, o que tem influenciado no seu modelo de gestão. Existe um elevado grau de fragilidade econômica e financeira nos principais clubes brasileiros de futebol. O problema é mais estrutural do que parece e não se limita às dificuldades financeiras enfrentadas pelos clubes. Isto é decorrente da ineficácia na gestão, onde impera amadorismo. Um clube de futebol somente terá sucesso se a gestão administrativa e do futebol caminharem lado a lado. Sem esta consciência e prática, os resultados dentro de campo não acontecerão.
AT – O Vale do Taquari tem um grande número de atletas que aspiram o profissionalismo no futebol. Qual sua avaliação do trabalho feito nas escolinhas e nas categorias de base? O que pode ser melhorado?
Claiton Fernandez – É fundamental que as escolinhas e categorias de base tenham um modelo de negócio, acompanhado de um planejamento estratégico para cada atleta. O foco deve ser formar cidadãos e perseguir, sem cessar, a carreira de atleta de futebol profissional. É importante promover intercâmbios nacionais e internacionais, participando de torneios, para obter experiências e encaminhar atletas. Existem marcas de empresas querendo investir em programas esportivos, mas faltam projetos consistentes.