A história e os costumes gaúchos têm sido devidamente celebrados. Vinte de setembro é o ponto alto, mas o gauchismo é exaltado o ano inteiro – em livros, em filmes, nos CTGs. Pouca gente não tem uma pilcha; a maioria toma chimarrão; muitos falam “tchê”. Aliás, este nosso orgulho, o amor dos costumes antigos, a imodéstia, etc. chegam a provocar zombaria em outros estados do Brasil. Mas a gauchada segue impávida. Pensem o que pensarem, continua cantando o hino rio-grandense em tudo que é festa.
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Interessante observar que uma obra como “O tempo e o vento” de Érico Veríssimo não tem par no país. É uma espécie de epopeia. Colocando uma família no centro, conta os feitos do povo do sul. Coisa parecida faz o livro “A casa das sete mulheres”, que igualmente retrata a história de bravos e foi grande sucesso ao ser exibida na TV há alguns anos. Em se tratando dos gaúchos, a literatura raramente fala de ignorância, de pobreza e de mau-caratismo. Os peões são valentes, leais e honestos e isto se pode ver já na famosa coletânea de contos de Simões Lopes Neto, os “Contos gauchescos”, publicados há quase um século.
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Por outro lado, os livros que contam histórias da colônia, onde se estabeleceram os pequenos agricultores de origem alemã e italiana, são muito menos conhecidos. Olhando de fora quase parece que esse grupo não integra a nação do sul. Em parte, talvez, por que esses colonos não tiveram tempo para nada que não fosse o trabalho. Roça, arado, cozinha e uma penca de filhos levados para a enxada tão cedo isso fosse possível não constitui fórmula de muito glamour. A disciplina da labuta nos minifúndios familiares tem menos charme do que as cavalgadas livres nos campos abertos.
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Pela escassez de relatos da vida da colônia ganha maior destaque o livro que a escritora lajeadense Vera Nicaretta publicou em 2017. Intitula-se “A terra é testemunha: romance histórico” e focaliza a vida nas pequenas propriedades rurais e em torno dos vilarejos do interior. Ao longo de 387 páginas, Vera Nicaretta vai acompanhando a história de famílias na região de Canudos, na época que era distrito de Lajeado. Os três longos capítulos englobam o período que vai de 1968 a 1970 e fazem uma reconstituição primorosa da época. Mostra como a vida era antes que a energia elétrica chegasse e operasse a gigantesca transformação que operou. Acho que, até hoje, ninguém fez um relato tão completo, realista e pitoresco sobre o cotidiano da nossa região.
É uma pena que o livro se encontre esgotado. A boa notícia é que a autora está preparando uma nova edição com acréscimos e algumas correções. Vale a pena ficar de olho e correr quando a nova fornada ficar disponível.