Você já se perguntou onde acaba a ambição e começa a ganância, a falta de ética e respeito?
Na opinião da psicóloga Maria Angélica Hartmann Gräff, a ambição jamais pode estar separada da ética. Contudo, ela afirma que estamos rodeados de exemplos de ambições que deveriam ser saudáveis e que já se transformaram em ganância e desrespeito: promessas políticas, apenas para ganhar a eleição, e jamais cumpridas, pais que permitem que os filhos dirijam carros e motos sem habilitação, greves que maltratam pessoas inocentes (a greve é um direito, desde que não cause sofrimento alheio), agressão moral ou física de qualquer tipo (insultos por pensar que tem mais poder profissional, político ou familiar), etc.
De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa de Silveira Bueno, ambição “é o desejo imoderado de riquezas, glórias, honras” e ambicionar é “desejar riquezas imoderadamente”. Ainda segundo o mesmo dicionário, ganância é “avidez, ambição de dinheiro, de lucro, exploração comercial dos negociantes” e ganancioso “ambicioso, ávido de dinheiro, sovina, etc”. A partir dessas definições, a psicóloga chama a atenção para a relação entre os termos ambição e ambicioso e ganância e ganancioso, mas pondera “ a ambição está relacionada à ganância, ou seja, pode fazer parte, mas os conceitos se diferenciam, na medida em que o ambicioso não é necessariamente ganancioso e, se pensarmos que riquezas, glórias e honras não precisam estar ligadas ou interligadas com poder financeiro, o conceito se torna mais ético.”
Para ela, ser ambicioso é uma necessidade básica do ser humano, e a ambição, quando equilibrada, impulsiona as pessoas a fazer mais e melhor para si e para os outros. “Se ganhar dinheiro com isso melhor ainda! Os grandes empreendedores certamente são ambiciosos, desejam ir além, desejam alcançar um padrão de vida melhor, desejam produzir, ganhar, mas dão sua contrapartida humana quando buscam estudar, dividem seu saber com seus colaboradores (sem eles as empresas morrem), desejam estar e viver melhor. Vejam como isso se parece com muitas atitudes nossas diante da vida: emagrecer, uma ambição, mas sem desejo e sem esforço, ela não acontece. Ganhar dinheiro: sem estudo, trabalho, ética, bons relacionamentos, melhora nas habilidades de vendas, por exemplo, não acontece! Iniciar e concluir uma graduação é uma ambição, um desejo, mas sem a contrapartida humana de estudo, pesquisa, ela não acontece!”
Ambição com equilíbrio
Maria Angélica acredita que se não tivermos ambição, mas ambição com equilíbrio, ficamos parados no tempo, sem desejo, vive-se por viver: “A ambição nos protege da inércia assim como o medo nos faz ter cuidado ao atravessar uma rua, a ansiedade nos sinaliza que pode ter um perigo ali à frente, a tristeza nos faz pensar e elaborar um luto, a inquietação nos faz pensar e repensar atitudes, modelos e paradigmas e nos estimula a realizar mudanças, enfim, nem tudo que parece ser ruim pode realmente ser! Equilíbrio, ética, respeito e outros conceitos básicos do viver podam arestas e nos lapidam para sermos melhores.”
A psicóloga afirma que em nossa cultura atual ambição é como diriam as mulheres “um pretinho básico”, até porque estamos vivendo em um mundo absolutamente competitivo, onde “chegar lá custe o que custar” parece que virou chavão. E levanta questionamentos: Qual nosso papel diante disso? Estimular nossos filhos a sucumbir a esse padrão estereotipado e fora de padrões éticos de convivência? Segundo ela, é possível observar crianças que não querem participar de jogos, competições, trabalhos em grupos, festinhas, pois temem não ser aceitas, não admitem que em jogos ganha-se e perde-se. Ver jovens utilizando as vias públicas como pistas de corrida, seu objeto de desejo ou ambição – carro – precisa ser mostrado, exibido. Freud associou a ambição ao Complexo de Édipo, etapa em que a criança se identifica com seu genitor do sexo oposto e compete com o do mesmo sexo pelo amor e atenção do pai ou da mãe. O dono do falo (símbolo do poder masculino na psicanálise) precisa mostrar, exibir, e isso, na opinião de Maria Angélica, “já não é mais ambição, mas ganância desmedida, é falta de limites, falta de ética e de amor próprio.”
Ela avalia que devemos, sim, ser ambiciosos, mas devemos escolher e medir qual será nossa meta, a que servirá essa ambição?: “Quando desejei ser mãe, sabia que teria muitos desejos, ambições para meu filho. Mas será que essas são as dele?” Precisamos ser ambiciosos, mas ao mesmo tempo estimular a ambição saudável das pessoas que convivem conosco, precisamos aprender a respeitar espaços, ouvir os desejos e opiniões dos nossos companheiros de jornada, sejam filhos, familiares, colegas de trabalho, amigos, etc. Portanto, a ambição jamais pode estar separada ética!
A maneira como fomos educados (se com atitudes positivas ou negativas de nossos pais ou cuidadores) faz muita diferença. “Se conseguirmos mostrar para as crianças que correr riscos é saudável, que as derrotas fazem parte do crescimento, ensinar a cuidar e zelar pelos laços com a família, amigos, escola, cuidar da natureza, respeitar o próximo, com certeza, estes e outros ingredientes farão de nossas crianças adultos ambiciosos, confiantes, determinados e especialmente éticos,” conclui Maria Angélica.